domingo, 29 de abril de 2012

MIOMAS E GRAVIDEZ

Sem dúvida alguma esta é uma das questões mais importantes que lidamos no consultório quando estamos diante de uma paciente com miomas uterinos e que deseja engravidar. Sabemos que inúmeras mulheres engravidam sem maiores dificuldades, apresentam uma gestação absolutamente normal e têm seus filhos sem complicações apesar dos miomas. Além disso, podemos dizer também, que a maioria destas mulheres nunca soube e nunca saberão que tem miomas uterinos.
Mas, quando os miomas interferem, existem maneiras diferentes de este evento acontecer. As principais questões a serem levantadas quando o assunto é miomas e gravidez são:

1. Os miomas dificultam a engravidar?
2. Os miomas aumentam o risco de abortamento?
3. Os miomas podem levar a complicações durante a gravidez e no parto?
4. Se os miomas forem tratados, quais as conseqüências deste tratamento para a fertilidade e para uma futura gravidez?

Sabemos que não são todos os tipos de miomas que podem levar a uma dificuldade para engravidar. Na verdade, a maioria dos miomas não tem essa característica. Para que essa dificuldade ocorra, os miomas basicamente dificultam o encontro do espermatozóide com o óvulo. Isto pode ocorrer de várias maneiras. Pode ser com um mioma submucoso ou com um ou vários intramurais que distorcem a cavidade uterina ou comprimem as trompas.

A maioria das mulheres que tiveram um abortamento espontâneo nos primeiros três meses de gestação nunca soube que estavam grávidas. Diversas causas podem estar relacionadas a estes abortamentos precoces, sendo a mais comum, alterações genéticas fetais incompatíveis com a vida. No entanto, se os miomas estão presentes, tendemos atribuir as perdas a eles. Mas, para isto, é necessário estabelecer se eles ocupam ou distorcem a cavidade uterina. Estes miomas podem sim levar a um aumento do risco de abortamento espontâneo no primeiro trimestre da gravidez. Perdas gestacionais no segundo e terceiro trimestres da gravidez, por sua vez, estão raramente associados a problemas fetais. Geralmente, podemos atribuir estas perdas a problemas uterinos, dentre eles os miomas.

Se os miomas não causam infertilidade ou abortamentos, eles podem levar a um aumento das complicações durante a gravidez. Os miomas possuem receptores para os hormônios produzidos durante a gestação. Por este motivo, quase sempre podemos observar o crescimento dos miomas durante a gravidez. Esse crescimento é variável e dependente de diversos fatores, como vascularização e localização dos miomas.

Os miomas durante a gravidez podem sofrer o que chamamos de auto-embolização. Esta auto-embolização ocorre quando o mioma cresce mais do que sua capacidade de receber sangue para sua própria nutrição. Com isso, o mioma começa entrar em infarto, ou seja, o mioma literalmente morre. Por este motivo, a dor é mais freqüente do que em pacientes grávidas sem miomas, ocorrendo em até 15% das gestantes com miomas. Os miomas também podem aumentar a incidência de partos prematuros, ocorrendo em até 20% das pacientes. Estes dois eventos ocorrem mais quando os miomas crescem significativamente de tamanho e quando os miomas se localizam próximos à placenta.

Esta localização dos miomas próximos à placenta também aumenta consideravelmente a incidência de descolamento prematuro de placenta. A incidência de descolamento prematuro de placenta pode chegar até 60% em miomas com esta localização, contra 2,5% para miomas em localizações diferentes. Em gestantes com miomas, o risco de sangramento no primeiro trimestre é duas vezes maior. O risco de apresentação pélvica é quatro vezes maior. O risco de contrações uterinas ineficazes no momento do parto é duas vezes maior e o risco de cesariana é seis vezes maior. Não existem evidências que o crescimento fetal intra-uterino seja afetado.

Apesar do risco de infertilidade, de abortamentos e de complicações durante a gravidez, não existem evidências de que os miomas devam sempre ser tratados em mulheres que desejam engravidar. As complicações dos tratamentos e seus efeitos colaterais também devem ser levados em consideração na relação risco-benefício quando estamos diante de um caso destes.

As evidências científicas demonstram ser a miomectomia (retirada cirúrgica do mioma) o padrão ouro para mulheres que possuem miomas, desejam engravidar e necessitam de tratamento. No entanto, as miomectomias por laparotomia e laparoscopia estão relacionadas a uma incidência elevada de formação de aderências pélvicas. Estas aderências podem levar não só a dor, mas também a distorções anatômicas da pelve, bloqueando as trompas, levando à infertilidade. Alem disso, essas miomectomias, quando não são realizadas com suturas uterinas adequadas, aumentam o risco de ruptura, devido à fragilidade que causam a parede uterina. A ruptura uterina está associada a um alto índice de morte fetal. Já a miomectomia videohisteroscópica não está relacionada a um aumento da incidência de ruptura uterina. Diversos estudos não demonstraram impacto na infertilidade deste tipo de miomectomia. Embora sinéquias uterinas (aderências intra-uterinas) possam ocorrem após uma miomectomia por videohisteroscopia, elas podem ser facilmente desfeitas, restabelecendo a anatomia da cavidade uterina.

Na década de 90, a embolização surgiu como um método alternativo e promissor no tratamento dos miomas uterinos. De fato, a embolização dos miomas uterinos é um dos tratamentos com menor índice de complicações e com índice de sucesso bastante satisfatório. No entanto, não devemos ignorar o possível impacto que ela pode ter na fertilidade da mulher com miomas. Apesar da evolução da técnica e da sofisticação dos materiais utilizados ter diminuído significativamente os riscos, a embolização também pode trazer conseqüências negativas na fertilidade da mulher. A disfunção ovariana, temporária ou não, levando a amenorréia (parada da menstruação) pode ocorrer em 5% a 8% dos casos. Isto pode ocorrer por dois motivos. Primeiro pela radiação que os ovários recebem durante o procedimento (por se tratar do uso de imagens geradas por um equipamento de radiologia digital, com emissão de raios-X), segundo pela possibilidade de embolização dos vasos responsáveis pela vascularização dos ovários. Além disso, existe a possibilidade, mesmo que remota, de embolização total ou parcial do endométrio, com comprometimento da vascularização deste, dificultando o preparo deste endométrio para a implantação do ovo fecundado ou até mesmo aumentando as chances de desenvolver uma placenta acreta, ou seja, quando a placenta está intimamente aderida à parede do útero, dificultando seu desprendimento após a saída do recém-nato. Felizmente, o aprimoramento da técnica, o uso de materiais cada vez mais modernos e a existência de equipes cada vez mais experientes estão diminuindo consideravelmente a incidência destas complicações.

Por fim, a ablação dos miomas por ultra-som focalizado guiado por ressonância magnética (MRgFUS) tem se mostrado um método bastante eficaz no tratamento dos miomas sintomáticos, principalmente os que estão relacionados à infertilidade. A grande vantagem deste tratamento esta em possuir um índice baixíssimo de complicações. Apesar de já existirem relatos de gestações após o tratamento com MRgFUS, muitos estudos ainda são necessários para classificar este tratamento totalmente seguro para mulheres que desejam engravidar. Mas, evidências têm sugerido que, muito em breve, a ablação dos miomas por ultra-som focalizado poderá ser eleita como mais uma alternativa para o tratamento dos miomas em mulheres que desejam engravidar.

Em pacientes sintomáticas, decidir pelo tratamento dos miomas não é difícil. Mas, muitas vezes, decidir qual tratamento é o mais adequado pode ser algo muito delicado. O desejo de gravidez deve sempre ser respeitado. Já em pacientes assintomáticas, a decisão por realizar o tratamento dos miomas pode ser bastante complexa. Por este motivo, devemos sempre pensar na relação risco-benefício de realizar ou não o tratamento e da relação risco-benefício do tratamento proposto, não se esquecendo de sempre estarmos respaldados pelas evidências científicas e na experiência da equipe que executará o tratamento.

Fonte: BuscaSaude

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